Rússia já está em guerra com o Reino Unido e estamos sem apoio dos EUA, alerta conselheira britânica
O Reino Unido enfrenta uma situação geopolítica “extremamente complicada”, preso entre a “rocha” da Rússia de Vladimir Putin e a “posição difícil” de um Estados Unidos cada vez mais imprevisível sob o presidente Donald Trump. A avaliação é de Fiona Hill, ex-conselheira da Casa Branca para a Rússia e uma das autoras da revisão de defesa estratégica britânica, em entrevista ao The Guardian. Segundo Hill, a Rússia está em guerra com o Reino Unido, e o país precisa se tornar mais coeso e resiliente para responder a essa nova realidade.
A Ameaça Russa e a Visão de Putin
Hill, que viveu nos EUA por mais de 30 anos e mantém dupla nacionalidade, destaca que a Rússia se fortaleceu como adversária de maneiras que o Ocidente “provavelmente não havia previsto totalmente”. Ela argumenta que Putin vê a guerra na Ucrânia como um ponto de partida para Moscou se tornar “uma potência militar dominante em toda a Europa”.
A especialista aponta que a Rússia já está “ameaçando o Reino Unido de várias maneiras diferentes”, citando envenenamentos, assassinatos, operações de sabotagem, ciberataques, operações de influência e tentativas de destruir cabos submarinos. A conclusão de Hill é categórica: “A Rússia está em guerra conosco”. Ela lembra que alertou para essa situação em 2015, após a anexação da Crimeia, mas muitos não prestaram atenção. Putin, segundo Hill, considera a luta na Ucrânia “parte de uma guerra por procuração com os Estados Unidos”, e é assim que ele convenceu países como China, Coreia do Norte e Irã a se juntarem a ele.
A instabilidade do aliado americano
Sobre os EUA, Hill enfatiza que o Reino Unido não pode mais contar com a proteção militar americana como na Guerra Fria. Em um governo Trump, o Reino Unido “está tendo que administrar seu aliado número um”, evitando uma ruptura, mas reconhecendo que a parceria não é mais a mesma. Essa percepção se reflete na revisão de defesa britânica, que admite que as “suposições de longa data do Reino Unido sobre os equilíbrios e estruturas de poder globais não são mais certas”, um reconhecimento raro da influência do trumpismo na política externa.
Hill descreve a Casa Branca de Trump como “não é uma administração, é um tribunal”, onde um presidente transacional é movido por “seus próprios desejos e interesses”. Apesar disso, ela aponta que Trump tem “uma afinidade especial pelo Reino Unido”, baseada em seus laços familiares (mãe de origem escocesa) e admiração pela família real.
Fiona Hill expressa preocupação com a ascensão do populismo de direita e das “guerras culturais” no Reino Unido, que podem imitar o cenário americano. Ela critica a ideia de “eficiência governamental” inspirada em modelos como o de Elon Musk, alertando para o impacto devastador de demissões em massa.
A solução, segundo Hill, é que o Reino Unido construa maior coesão interna para se proteger em tempos de incerteza. Isso implica não depender exclusivamente de ninguém, mas ter uma “mentalidade diferente” que combine a defesa tradicional com a resiliência social. A especialista sugere o ensino de primeiros socorros nas escolas e o incentivo à participação em forças de cadetes como parte de um “esforço nacional” para engajar as pessoas em suas comunidades.
Hill desafia as métricas convencionais de defesa, argumentando que a guerra moderna está mudando com a tecnologia. “As pessoas continuam dizendo que o exército britânico tem o menor número de tropas desde a era napoleônica… As métricas estão todas erradas aqui”, afirma ela. Como exemplo, cita a Ucrânia, que, sem marinha, “afundou um terço da frota russa do Mar Negro” usando drones.
Seu objetivo, portanto, não é apenas criticar, mas propor soluções, reconhecendo que “as pessoas entendem que temos um problema e que o mundo mudou”.
