Brasil aperta as regras de uso de redes sociais por crianças e adolescentes
O Brasil se prepara para implementar um marco regulatório inédito na proteção de crianças e adolescentes na internet. A partir de março de 2026, as plataformas digitais, incluindo redes sociais, deverão seguir as exigências do Estatuto Digital da Criança e do Adolescente (ECA Digital), que se tornou lei em setembro (e ficou conhecida como Lei Felca).
Embora o país não adote a proibição total de uso de redes por menores de 16 anos, como a Austrália começou a fazer, as novas regras brasileiras colocam a responsabilidade da segurança online diretamente sobre as plataformas e lojas de aplicativos, exigindo medidas rigorosas de controle e transparência.
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As regras centrais do ECA Digital forçam as empresas a abandonarem o método de autodeclaração de idade, o popular “Sim, tenho mais de 18 anos” facilmente burlado. As plataformas com conteúdo potencialmente impróprio para menores de 16 anos serão obrigadas a:
- Verificar a idade dos usuários sem aceitar autodeclaração;
- Vincular as contas de menores de 16 anos aos perfis de seus pais ou responsáveis.
A eficácia dessas medidas é comprovada: no Reino Unido, o Pornhub, por exemplo, perdeu 47% de sua audiência após implementar a verificação aprimorada.
Como será feita a verificação de idade
A regulamentação dos métodos de verificação caberá ao Ministério da Justiça, que definirá o rigor da checagem conforme o risco que a atividade ou o conteúdo oferece ao menor.
Em vez da simples autodeclaração, as plataformas deverão utilizar métodos mais robustos, como: análise de comportamento (que estima a faixa etária pela navegação), envio de selfie (com reconhecimento facial para idade aproximada) ou o envio de documentação (como a foto do CPF para idade exata). Lojas de aplicativos (Google Play, App Store) e sistemas operacionais (Android, iOS) também serão responsabilizados pela verificação.
Privacidade e punições para o setor
O tratamento dos dados de idade deverá seguir o conceito de Prova de Conhecimento Zero (Zero-Knowledge Proof), buscando confirmar a maioridade sem necessariamente armazenar a data exata de nascimento, visando garantir a privacidade do usuário, conforme destacou Luiz Felipe Monteiro, da Unico. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) exige que o tratamento dessas informações atenda ao “melhor interesse” da criança e do adolescente.
Plataformas que falharem na proteção e nas medidas de verificação estarão sujeitas a punições severas, incluindo multas de até 10% do faturamento ou R$ 50 milhões por infração, suspensão ou até mesmo proibição de atuação no Brasil. A aplicação da lei será monitorada pela Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD).
O pacote abrangente do ECA Digital
O Estatuto Digital vai além da verificação de idade. A nova lei proíbe práticas consideradas prejudiciais e exige maior transparência das grandes plataformas (com mais de 1 milhão de usuários). Entre as medidas estão:
- Proibição de publicidade direcionada baseada em grupos de crianças e adolescentes.
- Proibição de monetização e impulsionamento de conteúdos que retratem menores de forma sexualmente sugestiva ou erotizada.
- Proibição das caixas de recompensas (loot boxes) em jogos direcionados a este público.
- Obrigatoriedade de ferramentas acessíveis para supervisão parental e níveis de proteção por padrão.
- Exigência de remoção e comunicação imediata às autoridades de conteúdos de aparente exploração, sequestro ou abuso.
Especialistas, como Maria Mello, do Instituto Alana, ressaltam que a verificação de idade é fundamental, mas só será eficaz se articulada com as demais medidas de proteção e educação digital previstas na lei, cujo objetivo é empoderar as famílias e garantir a autonomia e o pensamento crítico dos jovens na internet.


